Quando se é criança, fala-se muito em crescer.
Na verdade, quando somos crianças, conjugamos o verbo no sentido literal e não no figurado. Imaginamos que o nosso corpo dirá que, enfim, crescemos, mas que, ao mesmo tempo, continuaremos a ter sonhos que não conhecem a impossibilidade, nem sequer sabem o que é adversidade. Assim, poderemos continuar sendo nós mesmos, só que “grandes” para poder fazer as coisas “tão boas” que os adultos fazem.
As crianças mais admiradas – ou as que eu mais admiro – são as extravagantes, audaciosas, inteligentes, sapecas, espertas, ativas, etc. Essas merecem o “não é uma graça?”. Ou alguém acha graça de criança que não faz nenhuma graça, das sempre emburradas e envergonhadas? Preferências à parte, não é disso que quero falar.
Estávamos tão enganados quando criança quanto agora que somos adultos. Pois, quando temos a comprovação de que nos tornamos gente grande, percebemos que nossas graças não têm mais graça. Elas, pelo contrário, apenas demonstram que somos crianças grandes, homens que não cresceram. E digo que ainda estamos enganados porque não vejo mal algum em ser isso.
As crianças cortam os próprios cabelos, fazem tatuagem de chiclete – e usam os anéis que vêm neles –, elas dançam à vontade, falam o que pensam, como e quando pretendem. São advertidas, mas perdoadas por serem crianças.
Se eu pudesse fazer tudo que quero e fosse perdoada pelo mundo com apenas algumas chineladas... ahhhh, correria sempre o risco.
Acontece que, quando se cresce, não é o que acontece.
Precisamos nos justificar o tempo todo pelo o que somos, fazemos, pensamos, acreditamos.
Não mais se contratam os tatuados para salva-vidas. E a vida pessoal, como um livro, precisa ser lida do início ao fim para se saber se somos confiáveis. Aliás, confiança é um substantivo que virou artigo de luxo.
Bom senso virou covardia. Não vejo outra forma de o ver quando alguém me diz: “seja cauteloso, tenha bom senso!”, ou seja, desista, não fale, não lute, apenas pense em fazer tudo isso e veja o quanto será ruim. Para quem?
Esta é a vida adulta: trabalho, carreira, cobrança, responsabilidades, batalhas, conquistas e, quando dá, um chope no bar.
Se eu fosse criança hoje, não mais sonharia em apenas crescer. Na altura que eu tivesse, seria capaz de enxergar que grande mesmo tem de ser nossa coragem. Eu pensaria que o mundo seria mais feliz se eu pudesse ser algumas em uma só: retratos que se complementam e não se contradizem.
Posso dançar como quiser – sou dançarina.
Fotografar-se também - sou modelo.
Escrever o que quiser – licença poética.
Falar o que achar que devo falar, usando, daí sim, o lado bom do senso – foi uma vertigem.
Fingir livremente - sorry, I'm an actress.
E, nas horas vagas, errar. Pois é nelas que sou, de fato, um ser humano que um dia foi uma criança que sonhava em ser grande para ser feliz. Que ironia quando há rima com alegria!
Que me desculpem os que não gostarem, mas aqui não sou uma criança grande, sou uma cronista.
E, crianças, aproveitem enquanto há tempo – e dinheiro dos pais – para se aproveitar ... algo.
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